Renegado ao longo dos séculos, o botãozinho lascivo merece ser pauta das nossas conversas
O que o pequeno clitóris tem de potente, também tem de desconhecido. Não que ele queira ser um mistério indesvendável, mas o pobre foi censurado por séculos, exilado dos livros de anatomia e mutilado em hospitais. Além disso, foi tão excluído das conversas de bar, que não ganhou nem apelidos divertidos, metafóricos. Só grelo, nomezinho sem carisma, sem humor algum.
Apesar de ser a peça-chave para orgasmos e convulsões de prazer, o Clit é sensível e nem tudo que parece agradar acaba sendo eficiente. Como, por exemplo, nos amassos em que o casal ainda não se desfez das roupas e, apesar do tesão que flui em líquidos por entre as partes, decide-se esperar mais ainda para desabotoar as calças. É a tentativa de prorrogar ao máximo o momento em que finalmente a pele terá o gostinho de roçar a outra pele.
As mãos massageiam o que há entre pernas por cima do jeans – afinal é preciso fazer com que o corpo suplique por mais. A mão esfrega com mais fervor o grelo recoberto por calcinhas e saias, mas a prorrogação das preliminares estouram o tempo.
Na melhor das hipóteses, o algodão, que se intrometia no meio do toque, seca a umidade de uma brincadeira que tinha começado bem. Já no cenário não tão bom, os tecidos que intermediavam o esfrega-esfrega não só secam como machucam. As peles ficam tão irritadas que, por mais que não queriam fazer manha, passarão as próximas horas sem poder se deleitar nem com o mais suave dos toques.
Pode ser também que os carinhos recobertos não machuquem, nem sequem a moça, simplesmente porque a mão errou o lugar. As roupas contribuem para agravar o problema de cegueira tátil e, na procura de uma fenda, encontra-se o espaço entre a virilha e a coxa. Acreditando de pés juntos que é alí que reside o clit, o parceiro se esforça para conseguir arrancar gemidos das suas manobras na virilha. Claro que o trabalho será em vão. Deste tropeço, só se arranca o desconcerto da parceira que tenta avisar sem ofender que ele simplesmente errou.
Salvo algumas exceções que realmente não fazem a mínima ideia, os rapazes no geral sabem, ao menos em teoria, que o clitóris está ali entre os grandes lábios, bem em cima dos pequenos. Mas, mantendo os olhos fechados, ou focados em outra parte do corpo, as pessoas se perdem nas múltiplas movimentações do pré-sexo.
Então, por falta de uma perícia táctil, os dedos erram de endereço. Simplesmente erram. Sem as calças no meio do caminho, a garota espera que tudo corra e escorra bem, mas a mão que finalmente entra pelos lábios escolhem outro pedaço de pele para massagear e gastam esforços em uma área que até gosta de carinhos, mas não consegue aproveitá-los por saber que está sendo confundida com o clit.
O esperançoso, que não se deu conta do erro, olha para sua parceira, a espera qualquer feedback – uma cara de prazer, sobressaltos –, qualquer coisa que lhe recompense as carícias. Mas estes gemidos sinceros não chegam, nem nunca chegarão, porque a moça se concentra agora, mais uma vez, em como desfazer o engano.
Claro, é perdoável. Pode ser que o parceiro tenha escolhido peles labiais, suculentas, vizinhas da vagina mas sem nenhum clitóris por baixo. Uma leve miopia tátil que, por sorte, levou em consideração que o melhor é sempre tocar o grelinho quando há peles por cima. E afinal, o desconcerto de não sentir muita coisa é melhor que o os sobressaltos de aflição e dor que causam os escavadores de clitóris.
Estes, tentando garantir que não vão errar o alvo e que o vão excitar a parceira rapidamente com sua técnica inovadora de ir direto ao ponto, se atrevem a tirar do caminho todas as peles e prepúcios que envolvem o Clit e, então, o esfregam nu e cru. Aflição... Afliceta! O clitóris, por menor que seja, é o tecido da espécie humana com mais terminações nervosas por milímetros quadrados, mas não é um botão daqueles de laboratório que é só destampar e meter a mão ali, para acionar sirenes.
Não, ele funciona quase como um pênis, só que menor e muito mais sensível. Imagina quão pauflitivo não seria ter o prepúcio do pênis puxado para baixo, e então, sentir uma mão frenética dedicando certa força a esfregar só a cabecinha. Agora imagina a catástrofe maior se desenrolando quando, no meio dessa aflição incômoda, a moça se remexe tentando desviar do toque. Então, o parceiro não só não percebe o erro, como passa a acreditar que as contorções são demostrações de prazer e que acabara de fazer um movimento de mestre, e, portanto, deve continuá-lo a todo custo.
Ninguém nasce sabendo das coisas e, entre o tudo que se aprende, muito pouco ou quase nada foi ensinado sobre o clitóris – tanto para os homens quanto para as mulheres. Cada dia mais, ambos os sexos passam a dedicar mais atenção e carinho ao Clit: as moças se exploram e vão aprendendo seus caprichos por tentativa e erro. Com os homens, o método é similar, mas eles precisam de um feedback externo para se corrigir – e haverá erros entre os acertos. Não há nada de errado com isso, desde que eles sirvam pra suscitar o diálogo e o aprendizado entre dois.
É preciso entender que o deixa-que-eu-te-ensino ou o como-você-gosta? é com certeza menos embaraçoso e mais excitante que o prepotente eu-decifro-seu-corpo-sem-ter-manual.
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